Quando o Pampa começou a mudar.


 

Três anos depois de ter trocado o conforto da Zona Sul carioca pelo pampa, Anna Luiza já é capaz de sustentar qualquer discussão sobre criação, mesmo com os mais experientes estancieiros do lugar. Sem abrir mão da moto e da minissaia.


Anna Luiza Berchon des Éssarts de Oliveira Sampaio, ao contrário de uma vetusta baronesa, como o nome poderia sugerir, é uma jovem alegre de 27 anos, a pele ainda bronzeada pelo sol de Ipanema, e que um dia resolveu trocar o agito da zona sul do Rio de Janeiro por uma vida pacata em meio a rebanhos e douradas plantações de arroz. Com a incumbência de preservar um patri- mônio de mais de 200 anos, que são suas duas estâncias, perto de Pelotas, ela hoje as administra sozinha, empregando a técnica mais avançada que há no setor. Anna Luiza guém se engane que nin- é gente do pampa, tão identificada com o seu meio quanto a fi- gura tradicional de bomba- chas e chimarrão. Hoje ela já conhece o chão onde pisa, o pampa, coxilha ou campanha, o nome não importa, es- ta imensa planície, de cam- pos muito férteis, que domina toda a paisagem do extremo sul do país. Uma terra onde a princípio o clima inóspito, marcado pelo vento, e as lutas sangrentas pela demarcação de fronteiras, forjaram um habitante muito especial, o gaúcho, e seu companheiro inseparável, o cavalo.

Bombachas e minissaias

Três anos vivendo na estância, Anna Luiza ainda não assimilou perfeitamente esse vocabulário, nem a pronúncia cantada do gaúcho, que dá na gente vontade de imitar. Conserva, ao contrário, muito do sotaque carioca, carregado nos erres e nos esses e, mais que isso, trouxe para o pampa hábitos pouco ortodoxos, como, por exemplo, a moto, que ela utiliza no serviço da estância com o mesmo desembaraço com que hoje já pilota um irrequieto cavalo crioulo.

Da mesma forma, reveza o uso de bombachas com o de provocantes minissaias, que, tempos atrás, faria corar um bom gaúcho. Mas nem por isso ela deixa de ser respeitada e admirada por todos, mesmo pelos mais antigos e conservadores estancieiros do lugar.

Mas é preciso não esquecer que hoje uma das características mais marcantes desse pedaço de Brasil, incluindo Pelotas, Rio Grande e Bajé, seja exatamente esta: o equilíbrio quase perfeito entre o novo e o antigo, que Anna Luiza sabe expressar muito bem.

E, como ela, outros jovens, filhos de estancieiros, têm procurado aderir à vida no campo, fugindo das grandes cidades.

Sua amiga Regina Clara Simões Lopes é um exemplo.

Carioca, como Anna Luiza, hoje ela já divide o seu tempo entre o calor morno da metrópole e o vento gelado do pampa, onde se localiza a sua estância da Graça. Formada no tempo das charquea-das, essa estância conserva até hoje, em sua sede, fortificações contra ataques indígenas e é um dos muitos monumentos preciosos perdidos na imensidão do pampa.




Fonte: Revista Quatro Rodas Julho/1983.


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